Golegã: onde nem só o cavalo é rei


Em plena planície ribatejana, entre os rios Almonda e Tejo, e rodeada de verdejantes lezírias, a vila da Golegã é por excelência, a capital do cavalo lusitano.

Largo da Imaculada Conceição; Golegã

No seu livro Portugal, Miguel Torga afirma que "O touro, o cavalo e o campino são «o produto específico da terra ribatejana»”. A Golegã, no coração do Ribatejo, era um destino há muito adiado, que um fim de semana soalheiro acabou por concretizar.
A manhã foi passada a visitar a Casa dos Patudos, em Alpiarça, que pertenceu a José Relvas, proclamador da República a 5 de Outubro de 1910. Após o almoço com vista para o rio, segui em direção à Golegã. Parei na ponte da Chamusca para admirar esta construção em ferro com mais de 100 anos, que permitiu a ligação das duas margens do rio Tejo, facilitando a vida das populações locais. As terras férteis, devido às inundações do rio, são um dos expoentes da beleza natural, onde o olhar se perde na sua imensidão.

Ponte da Chamusca
Quando planeei o meu fim de semana no Ribatejo, achei que fazia sentido conhecer uma coudelaria. Tinha lido alguns artigos que falavam de várias quintas e comecei a fazer contactos, e para minha grande surpresa, não havia nenhuma que fizesse visitas. Simplesmente não tinham este serviço para o público nem mostraram disponibilidade em abrir uma exceção. Lamentei. Assim sendo, o primeiro local onde parei quando cheguei à Golegã foi no Equuspolis.

Equuspolis; Golegã

Excepcionalmente, o Museu Municipal Mestre Martins Correia estava encerrado. Foi pena não poder conhecer melhor a obra deste artista plástico, filho da Golegã. Limitei-me a visitar o parque. Apesar de ter vários espaços de lazer, talvez tenha sido o vento frio que não permitiu trazer a melhor impressão.
Junto ao Palácio do Pelourinho há lugar para estacionar. Mesmo em frente fica a Igreja Matriz da Golegã, também conhecida como Igreja de Nossa Senhora da Conceição.
Reparo em algo que já tinha visto pelo caminho: as placas indicativas dos serviços, como paragens de autocarros, praças ou cafés têm todas um cavalo. Olhando a igreja de frente, destaca-se logo o seu portal manuelino e entrando, os painéis de azulejos avulso ou com cenas bíblicas, merecem cuidada atenção.
A homenagem a Manuel dos Santos, um dos expoentes máximos da festa brava, é feita por uma estátua mesmo ao lado do Café Central.

Igreja Matriz da Golegã; Igreja de Nossa Senhora da Conceição; Golegã Estátua de Manuel dos Santos; Golegã

Frequentado por locais mas também por quem visita esta vila, é para lá que me dirijo em busca dos seus doces tradicionais. O ambiente é acolher, em tons quentes: as paredes ocres, o teto e portadas em madeira azul escura, com quadros e fotografias associados à tauromaquia. Experimento os toureiros, um pequeno bolo feito à base de açúcar, ovo e amêndoa (1,10€). É bastante doce e com um ligeiro toque húmido.
Chego ao Largo D. Manuel I onde está a Casa-Estúdio Carlos Relvas. É muito devido a ela que a Golegã não se resume à conhecida Feira do Cavalo. Vista de fora, destaca-se de todas as outras, pelo exotismo da sua construção. Passando um pequeno lago, procuro a entrada mas todas as portas estão fechadas. Estivesse o local descuidado e pareceria uma casa assombrada.

Casa-Estúdio Carlos Relvas; Golegã

Casa-Estúdio Carlos Relvas; Golegã

Visitá-la não foi fácil. Horários trocados à porta, visitas a iniciar antes da hora marcada até que fiz uma pequena chamada de atenção e lá consegui entrar. Passando a porta principal, tenho de colocar uns sacos plásticos nos pés. Afinal, estou a pisar um chão Bordalo Pinheiro. Do lado direito fica a antiga câmara escura e do lado esquerdo sou recebida por… Carlos Relvas! Não é verdade mas parece. Enquanto assisto a um pequeno filme que retrata a sua vida e obra, é projetada a imagem para um boneco que recria na perfeição a sua figura. Ainda no rés-do-chão, na sala de espera, em estilo mourisco, está uma das melhores coleções de livros de fotografia, assim como diplomas de várias partes do mundo, reconhecendo o mérito de Carlos Relvas.
Subindo por uma escada em caracol de ferro coberta de madeira chego ao primeiro andar, onde era o estúdio e escritório. Apesar de ter apenas uma pequena mostra de objetos, a imaginação consegue preencher o espaço: terão existido telas retratando bonitas paisagens e os modelos chegavam envergonhados, receosos da objectiva. Aqui consegue perceber-se melhor toda a estrutura da casa, com mais de 30000kg de ferro e um sistema de panos para controlar a luz das suas “paredes” envidraçadas.

Casa-Estúdio Carlos Relvas; Golegã

Carlos Relvas foi um homem que viveu muito à frente do seu tempo. A possibilidade de viajar mostrou-lhe outras realidades e os seus talentos foram vários: lavrador, criador de cavalos, cavaleiro e músico, mas ficou conhecido pelo seu trabalho como fotógrafo. Na terra onde o cavalo é rei, Carlos Relvas é considerado o “príncipe da Golegã”.
Sigo por um intricado de ruas de casario térreo, branco, com frisos amarelos. Não se vê vivalma. É quase pôr-do-sol nesta pacata vila ribatejana.

Casario Golegã

Deixei para visitar em último o Museu Municipal da Máquina de Escrever, único no país e situado no primeiro andar do edifício da Biblioteca Municipal da Golegã. Tem mais de 300 máquinas expostas oriundas de vários pontos do mundo.

Museu Municipal da Máquina de Escrever; Golegã

Finalmente chego ao Hotel Lusitano, onde vou ficar hospedada. A fama da excelência da sua hospitalidade em nada desiludiu. É tempo de disfrutar do conforto deste hotel de charme enquanto recordo as histórias e pessoas que falam com orgulho do seu património.

5 comentários:

  1. Muito interessante!!! Adorei as fotos, principalmente a segunda (adoro pontes), a do café central e a B&W :) Não conheço muito bem a Golegã, apesar de já lá ter estado. Acho que este olhar me vai reconciliar com uma terra marcada por algo de que não gosto mesmo - a tourada. Há muitos outros pontos de interesse e é bom saber!
    Parar num café ou praça e desfrutar do tempo num lugar é dos meus GRANDES prazeres ;)

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  2. Muito interessante!!! Adorei as imagens, principalmente a segunda(gosto imenso de pontes), a do café central e a B&W :)
    Não conheço muito bem a Golegã, apesar de já lá ter estado, mas este olhar vai-me reconciliar com uma terra marcada por algo de que não gosto mesmo nada - a tourada. É bom saber que há, felizmente, outros pontos de interesse!
    Sentar-me num café ou praça a desfrutar de uns instantes num lugar é um dos meus mais apreciados prazeres...

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  3. Fico muito feliz por ter dedicado um fim de semana a terras Ribatejanas.
    De facto esta cidade vive e respira o espírito do cavalo e da sua feira o ano inteiro, e a sua paixão por cavalos está presente em cada esquina, e acredite, durante a Feira ainda se sente mais. Volte a visitar durante a feira, tenho a certeza que se vai sentir tele-transportada no tempo e espaço.

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  4. Olá Tânia: vou guardar a sua sugestão. Talvez este ano seja possível regressar à Golegã durante a Feira do Cavalo.

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  5. Olá Ana: então tem de regressar à Golegã. É uma vila pacata, de gente afável, que fala do seu património com o coração.

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